terça-feira, 23 de outubro de 2007

Em Nome da Terra

Em Nome da Terra.
Já o tinha saboreado há alguns anos e voltei a lê-lo.
A beleza de outrora ganhara novos contornos de fascínio, mas, embora a problematização do amor surja presa ao mesmo vigor e perturbação, esbarro, nesta repetida leitura, em renovadas descobertas e outros desencontros com a existência humana bem patente nesta obra de Vergílio Ferreira.
É um texto denso que nos lança nos caminhos da reflexão inquieta.
O romance é um autêntico poema ao corpo. João, o protagonista viúvo, reformado, recolhe-se a uma casa de repouso para não ser um peso à família e à sociedade e decide escrever uma carta à mulher que, entretanto, já falecera.

Um excerto:

"Entramos na água (...) Depois avançamos pelo mar, defrontamo-nos com a sua magnitude no nosso corpo vigoroso. E havia sol no teu ser imortal. E mergulhaste e escorria-te depois na face a festa do mar. E mergulhámos de novo para absorver o mar todo. E vogámos à tona de água, sustentados em nosso peso no seu dorso. Depois rompemos mar fora a um aceno invisível. E a eternidade existia. E nós parámos lá longe e deitamo-nos nela. O céu era muito azul e víamo-lo por cima. Havia nele espaço bastante para a nossa abundância interior e nós olhávamo-lo como quem chega à sua própria morada que não conhecia. Flutuamos no incerto de uma grandeza divina. Senhores da terra, do tempo. Da força, do poder. Estamos no meio do mar, olhamo-lo a toda a volta e o seu mistério infinito está em nós. Depois voltamo-nos para a praia, vamos remando devagar. Às vezes olhamo-nos. O teu riso estrídulo, os cabelos molhados, o mar cai-te das pestanas para os olhos. A face húmida, a alegria vertiginosa da vida, não há morte, não há morte. Depois deitamo-nos na areia ao sol, ouvimos o mar, o fervor na caldeira do mundo. Ou não o ouvimos, há o espaço do seu rumor e nós estamos no meio dele, deitados ao sol. Não vejo agora lá ninguém, para todo o espaço ser nosso. Enchemo-lo todo, estamos bem. (...) Não temos ideias, temos só a perfeição de estar".

Vergílio Ferreira, Em Nome da Terra.

22 comentários:

avelaneiraflorida disse...

EXCELENTE ESCOLHA!!!!

UM RESTO DE BOA NOITE!!!

O Sibarita disse...

Olá Rui! Meu caro amigo que texto genial, é 10, é ouro em pó!

Vou procurar esse livro aqui em Salvador/Bahia para compra-lo, faça fé! Tomara que eu encontre.

Olha obrigado pelas palavras no nosso blog, volte sempre...

abraços,
O Sibarita

António Inglês disse...

Estas ligações nunca mais se desfazem minha amiga. Disso eu tenho a certeza.
Uma boa noite serena
José Gonçalves

Mié disse...

Venho agradecer-lhe e retribuir-lhe a visita que me fez.

Denunciar o que está mal na política também é preciso, um trabalho excelente. Parabéns.

Não li este livro mas deve ser muito bom pelo excerto que aqui deixa.

"Não temos ideias, temos só a perfeição de estar". Sublime.

Uma boa semana.

Joaquim Moedas Duarte disse...

Gostei de vir aqui. Um blogue da Madeira! Que bom: temos contas a ajustar... Hoje não vou poder mas um dia destes...
Primeira interrogação: como é que se pode conviver com o "Em Nome da Terra" e o "soba" Alberto João?
Sem ofensa... Mas tenho curiosidade...
Saudações.

Anónimo disse...

O texto que apresenta não é mais do que um poema, excelente escolha.

Anónimo disse...

Olá Rui
A Bela ilha da Madeira. Uma pérola no meio do oceano. Pela primeira vez entro em contato com pessoa desta ilha. Vejo que defendes os interesses da terra. Parabens.
do Brasil, meu cordial abraço.
Geraldo

Tiago R Cardoso disse...

A ler sem duvida...

Silvia Madureira disse...

aqui está o amor...um amor eterno...de uma intensidade indescritível...mas conseguida pelo autor...beijo

Berta Helena disse...

Olá Rui Caetano!

Li esse livro há algum tempo. Sou, aliás, grande apreciadora da obra de Vergílio Ferreira. "Em nome da terra" deixou-me, isso mesmo, mergulhada numa "reflexão inquieta". Mas vale bem a pena lê-lo. É triste, real, perturbante e contudo, Belo.

Abraço.

quintarantino disse...

E fez muito bem. É um escritor notável.

Anónimo disse...

Conheço bem a obra de Vergílio Ferreira já li os seus romances e diários, é das obras mais valiosas da Literatuta Portuguesa.

Tatá disse...

Meu caro Rui, feliz escolha a sua.
Fiquei encantada com o texto; confesso que não conhecia.
E concordo com esse trecho por demais: "...não temos ideias, temos só a perfeição de estar".

Beijo grande
;)

adrianeites disse...

é um dos meus escritores favoritos!

ainda me recordo d'aparaição!

bom post!

MMV disse...

Nunca li esse livro... Não tive oportunidade... Contudo Vergílio Ferreira é fascinante! Só li o livro que nos foi recomendado na escola...

Plum disse...

Já li o livro!É realmente excelente, como tantos outros de Vergílio Ferreira!
Abraços!***

jorge esteves disse...

Aproveitando-me de uma frase, desse mesmo livro, diria que Vergílio Ferreira não é 'um prosador, é a própria prosa'. Na memória fica-me, por variadas razões, sempre submersa a leitura dele!...
Abraço

Grato pela visita. Volte sempre!

mixtu disse...

tenho de voltar a relê-lo...
excelente

abrazo europeo

Su disse...

adorei..............ler..reler


jocas maradas pela feliz escolha

isabel mendes ferreira disse...

tenho Tudo. juro.


porque a perfeição a existir está na Sua Escrita!




beijo.


sempre.
:)

Evelyne Furtado. disse...

Deitei-me nessa prosa encantadora. e vi o azul do céu e me entreguei ao mar. Lindo!!!
Abraços, Rui e obrigada pela visita.

P.S. Não conheço a Madeira mas descobri que meus antespassados vieram da ilha, aqui para o Nordeste do Brasil.

jawaa disse...

Obrigada pela partilha, faltava-me este...
Um abraço