Por José Tolentino Mendonça
Acho que foi Albert Camus que disse que a questão mais premente do nosso tempo é cada homem descobrir onde é a sua casa. Aparentemente é uma ideia estranha, pois a maior parte de nós não tem que se perguntar para onde deve voltar ao crepúsculo. Dia a dia há uma rota que voltamos a trilhar sem especiais hesitações, entre a fadiga e a esperança, cruzando as paredes do tempo: esse é o caminho para nossa casa. Cada um cumpre, mesmo sem especial reflexão, trajectórias e rituais que são seus: a estrada que escolhe para regressar (sempre a mesma, sempre a mudar…); a forma familiar que tem diariamente de rodar a chave; o modo (mais lento, mais repentino) de abrir para o que ali habita; aquela fracção de segundo, absolutamente impressiva, antes da primeira palavra, em que a casa inteira parece que vem ao nosso encontro, ofegante ou em puro repouso.
Que quereria dizer Camus quando escreveu: «cada homem tem de descobrir a sua casa»? Muitas vezes, perante as questões fundamentais e o embaraço de não encontrarmos imediatamente para elas respostas conclusivas, a própria actualidade vem em nosso socorro, mostrando como a vida é sempre mais simples que as deferências e os reenvios com que a abordamos.
Que quereria dizer Camus quando escreveu: «cada homem tem de descobrir a sua casa»? Muitas vezes, perante as questões fundamentais e o embaraço de não encontrarmos imediatamente para elas respostas conclusivas, a própria actualidade vem em nosso socorro, mostrando como a vida é sempre mais simples que as deferências e os reenvios com que a abordamos.
Por vezes basta ver, apenas. Basta-nos tomar um exemplo, tocar uma única entre os milhões de imagens que processam o presente, acolher a breve chama de uma história para que o longo corredor até ao sentido se ilumine.
Acho que a heróica aventura dos mineiros chilenos, que nas últimas horas todos acompanhamos, ganha aqui a sugestiva irradiação de uma parábola. Porque talvez possamos descrever o colossal investimento que foi necessário reunir para arrancá-los àquela escuridão que os mantinha sequestrados a 700 metros do chão, como o esforço que uma nação inteira fez para que um grupo de homens pudesse regressar a casa.
Acho que a heróica aventura dos mineiros chilenos, que nas últimas horas todos acompanhamos, ganha aqui a sugestiva irradiação de uma parábola. Porque talvez possamos descrever o colossal investimento que foi necessário reunir para arrancá-los àquela escuridão que os mantinha sequestrados a 700 metros do chão, como o esforço que uma nação inteira fez para que um grupo de homens pudesse regressar a casa.
Todos os elementos (a cápsula hiper-tecnológica com um apropriado nome mitológico, Fénix; a fidelidade das famílias; a representação ao mais alto nível das autoridades e do Estado; os hospitais de campanha para as peritagens médicas; o poder da engenharia e da economia; a curiosidade activa de batalhões de jornalistas…), no fundo, conspiraram para que 33 homens pudessem refazer (e certamente redescobrir) o caminho da sua morada.
Que isso tenha acontecido realmente, prova-o o comentário do pai do mais jovem mineiro soterrado, o boliviano Jimmy Sanchez, de 19 anos: «A 5 de agosto perdi um filho, mas hoje estou a receber um homem».
Que quereria dizer Camus quando escreveu: «cada homem tem de descobrir a sua casa»? Penso que a frase longa esconde este repto mais essencial: cada pessoa não tem apenas a tarefa de descobrir uma habitação. Cada pessoa tem o irrecusável dever de descobrir-se, vivendo com paixão e sabedoria a construção de si, esse processo que, por definição, está em aberto e que ao longo da existência se vai efectivando.
Que quereria dizer Camus quando escreveu: «cada homem tem de descobrir a sua casa»? Penso que a frase longa esconde este repto mais essencial: cada pessoa não tem apenas a tarefa de descobrir uma habitação. Cada pessoa tem o irrecusável dever de descobrir-se, vivendo com paixão e sabedoria a construção de si, esse processo que, por definição, está em aberto e que ao longo da existência se vai efectivando.
Nós somos a nossa casa. E poder dizer isso, com simplicidade e verdade, equivale a perpetuar aquilo que Albert Camus também escreveu: «no meio de um inverno, finalmente aprendi que havia dentro de mim um verão invencível».
DIÁRIO: Revista MAIS
1 comentário:
Pena que quando foi do desastre do submarino KURSK os Russos não tivessem permitido a ajuda de outras potências? Quando os segredos da guerra são superiores à vida humana, bem mal vai o Mundo.E ainda se dizem que há Igualdade, Fraternidade e, outras coisas mais? Não brinquem, o Chile deu uma prova de quanto vale a vida humana.
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